domingo, 9 de junho de 2024

Sobre o aborto

 Anos se passaram sem que escrevesse uma palavra... A vida dá voltas e as coisas mudam.

Neste meio tempo muita coisa mudou...

Enquanto casal estamos muito unidos, ultrapassamos dificuldades, e somos além de marido e mulher, melhores amigos. Ele é o meu pilar.

Tivemos o Tiago, nasceu em 2012. A gravidez correu bem, o parto nem tanto. Foi bastante traumático, principalmente para o Pedro que assistiu a tudo... No fim acabou tudo em bem e temos um filho saudável.

As circunstâncias do nascimento dele foram um fator determinante na decisão de ter um segundo filho. Eu queria, o Pedro teve dificuldade em ultrapassar a experiência. E o tempo foi passando...

Até que me vi no limite dos 39 para os 40 anos e tivemos uma conversa. Seria agora ou nunca. Pediu-me que aguardasse até julho nesse ano, que seria quando acabaria o 12° ano. Aquiesci. Em agosto começamos a tentar, no fim de 9 ciclos lá obtivemos o positivo no início de maio de 2023, portanto engravidei em abril.

Tudo corria bem, até que no dia em que fazia 10 semanas de gravidez tive uma taquicardia e tive de ir a urgência porque ao contrário das anteriores que tinha tido (já tinha feito exames, tudo normal) desta vez o ritmo subiu para valores alarmantes, 220 bom. A médica garantiu-me que a medicação não faria mal ao bebé, não teria feito qualquer diferença. Uma semana depois, no dia que faria 11 semanas, num sábado já em junho, quando viemos das piscinas e despi o biquíni, notei uma pequena manchinha acastanhada nas cuecas. Tomei banho, e quando me lavava, no puff apareceu mais uma manchinha. Não havia o que enganar, era sangue. Chamei o Pedro, perguntou-me se queria ir ao hospital, enquanto tomava banho disse-lhe que íamos ter calma, podia não ser nada. Mas depois quando sai do banho peguei num pedaço de papel higiénico e voltei a -me, mais sangue, escuro, mas sangue. Decidi que era melhor ir a urgência. Jantamos e fomos. Diagnóstico, aborto retido, o bebé tinha parado de desenvolver às 8 semanas, estava há 3 semanas morto no meu útero. A médica mandou-me para casa, para voltar dali por duas semanas para reavaliação. Já tinha começado o processo de expulsão, disse que não seria uma torneira aberta, mas que iria ter sangramento. Explicou-me os sinais de alarme, tais como febre e hemorragia abundante. Relativamente ao processo de expulsão em si não me deu qualquer informação, e na altura muito pouco encontrei em pesquisas. Nesse dia já tinha um leve desconforto na barriga que foi aumentando gradualmente á medida que os dias iam passando, até que na sexta-feira seguinte acordei às 6:30 da manhã com contrações. Não como as de parto porque nessas consegue-se respirar e encontrar alívio entre uma e outra, eram seguidas, ainda não tinha acabado uma já estava outra a começar, não havia posição que me aliviasse. Meti-me no poliban, sentada meio de lado no chão com água morna ora na barriga ora nos rins. Nessa altura perdia rios de sangue e coágulos enormes, tentei fazer força, mas tudo o que saia era sangue e coágulos. Ao fim de cerca de uma hora aliviou um pouco, continuei com dores mas as contratações pararam. Tomei banho, vesti-me, coloquei um penso normal da menstruação e fui para a sala, no segundo em que me sentei no sofá tive de me levantar porque senti uma descarga tão grande que o penso ficou ensopado no mesmo instante. Voltei a casa de banho e senti-me na sanita para trocar o penso, e senti uma coisa sair. Pensei que tinha expulsado mas não conseguia ver nada concreto. Voltei para a sala, só conseguia estar sentada meio de lado. Às 3 da tarde voltaram as contratações, o relatório é igual ao anterior, muito sangue, coágulos e cerca de uma hora depois aliviou. Até pensei que não dormiria nessa noite, mas fui vencida pelo cansaço e adormeci. No dia seguinte o Pedro acordou-me cerca das 10 da manhã, fazia uma semana do diagnóstico de AR. Comi qualquer coisa, entretanto a minha mãe ligou-me e enquanto estava a falar com ela comecei a senti-las a começar novamente. Quando terminei a chamada voltei para o poliban, fiz toda a força do mundo e não saía uma gota de sangue, nada... Após uma hora acalmaram e voltei para sala. Cerca do meio-dia o Pedro disse que o almoço estava pronto, e eu fui a casa de banho fazer xixi, quando olhei tinha um coágulo comprido pendurado, fiz força para ver se caía e nada, irritei-me e fiz mesmo muita força e senti sair uma bola disparada. O saco saiu inteiro, apontamos a luz do flash do telemóvel e conseguia ver-te perfeitamente os contornos do perfil de um bebé todo formado. O saco era do tamanho da palma da minha mão. Foi duro, física e emocionalmente, mas acabei por superar. Estive mais esse mês de baixa por interrupção da gravidez e regressei ao trabalho. Voltamos a tentar outra vez em agosto, voltei a engravidar em abril. Descobri 4 dias antes do dia da menstruação porque tive uma infeção urinária e fiquei desconfiada. Dois dias depois tive um corrimento cor de rosa, comecei logo a pensar o pior, mas era tão cedo que era consistente com o sangramento de nidação. Durou dois dias, depois parou. 4 dias depois comecei com um corrimento acastanhado, toda a gente dizia que era normal, que era o útero a limpar, mas ao fim de 4 dias não passava fui a urgência. A médica que me viu não quis fazer eco porque dizia que não se ia ver nada, observou-me com o espéculo e fez-me toque, decidiu que estava tudo normal e que tinha o colo do útero friável. 4 dias depois acordei com sangue vermelho vivo. De volta a urgência fui vista por outro médico. Uma mancha de sangue enorme no útero, segundo ele a medicação já não ia fazer aqui nada, mas pediu-me uma hemograma e um beta HCG, para ver se estava anemica e se a gravidez era para ir para a frente. Quando saíram os resultados fui chamada por outro médico, disse que o hemograma estava bom e que o beta indicava uma gravidez evolutiva. Mandou-me para casa com repouso absoluto e progesterona de 8 em 8 horas. Para voltar para reavaliação dali a duas semanas. Cumpri com as indicações e o sangramento foi diminuindo, até que parou, continuava com sintomas de gravidez, o que me dava um certo conforto, porque da última vez quando fui diagnosticada com AR, já tinha perdido todos os sintomas de gravidez. Regressei ao hospital 2 semanas depois, fui vista pelo mesmo médico que me tinha visto primeiro da vez anterior, de eco e disse que o saco cresceu mas que não tinha embrião. Disse que ia chamar o outro médico para ele ver o que queria fazer. Mandou-me ficar na marquesa, e ali fiquei cerca de dez minutos a espera, de perna aberta. Entretanto o outro médico veio, olhou para a eco que o primeiro tinha feito, e decidiu fazer nova eco. Disse que tinha embrião mas que estava bradicardico. Disse-me que não era bom sinal, até fez zoom no ecrã para me mostrar o pontinho a piscar, que seria o coração. Disse -lhe que tinha tido um duas taquicardias no dia anterior e que tinha tomado Concor e diazpam, se poderia ter alguma influência, uma vez que era medicação para baixar o ritmo cardíaco. Respondeu-me que em princípio não, mas que não me dava a certeza. Perguntei-lhe se continuava com a progesterona, disse -me que se não houvesse batimentos que me dizia que não valia a pena, mas assim que não íamos já atirar a toalha ao chão. Receitou-me aspirina para tomar todos os dias a noite e injeções de heparina para levar todos os dias de manhã até a próxima consulta, isto era terça e a consulta ficou para a quinta da semana seguinte. 

Durante esse tempo continuei sempre com sintomas de gravidez, quando regressei na quinta estive mais de 3 horas a espera porque o doutor estava numa cesariana e depois foi almoçar. Quando me mandou entrar disse para ir a casa de banho e deu-me o lençol do costume. Não percebi que tinha de fazer xixi, quando começou a eco é que me disse que tinha a bexiga cheia, eu disse que podia ir fazer xixi, mas não me respondeu e fez a eco mesmo assim. Fartou-se de procurar e carregar na minha barriga para conseguir ver alguma coisa, foi complicado. No fim disse que o saco não tinha reforço e que o broto embrionário estava lá mas que em princípio não tinha desenvolvido e que não lhe conseguia encontrar batimentos. Mandou-me para casa duas semanas, para regressar dia 20 deste mês para confirmar o diagnóstico e para ver se preciso de medicação. Mais um diagnóstico de aborto retido...

Mandou-me parar com toda a medicação, por isso no verão dele não há qualquer tipo de esperança. Apesar de não ter usado vocábulo definitivo, acho que é mesmo típico deste médico, dá uma opinião mas não afirma com toda a certeza. No fundo tenho um pouco de esperança de chegar lá daqui a duas semanas e o cenário ter mudado por completo, mas cá no meu íntimo sei que é muito difícil o médico ter-se enganado. 

Mas temos sempre esperança no milagre...

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